Lúpus
Resumo sobre lupus
O lúpus é uma doença complexa que pode apresenta diversas formas. Ele pertence às doenças ditas auto-imunes e atinge muito mais as mulheres do que os homens. O paciente geralmente apresenta lesões cutâneas características, cansaço, dores nas articulações, inchaços, entre outros sintomas.
É uma doença que pode passar anos sem se manifestar, mas de repente devido a um “fator desencadeante” que ainda não conhecido e uma suposta predisposição genética, a doença se instala, surgindo então uma série de sintomas que se assemelham a de diversas outras doenças, daí então a dificuldade de diagnóstico dessa doença, que até pouco tempo, contava apenas com que o médico fizesse a ligação de sintomas isolados e solicitasse exames mais específicos da doença.
Atualmente não é conhecida a cura para o lúpus, apesar dos diversos estudos clínicos que foram e estão sendo realizados mundialmente.
O tratamento depende do tipo de sintoma apresentado, mas em geral consiste no uso de AINEs (antinflamatórios não esteroidais como o paracetamol, aspirina e ibuprofeno), corticosteróides e uso de protetor solar.
Os novos tratamentos, à base de anticorpos, apareceram no mercado americano em 2011 e no Brasil em julho de 2013, como o belimumab (Benlysta).
As mulheres devem utilizar algum tipo de método anticoncepcional até que se queira discutir a possibilidade da gravidez. Nesse caso é importante consultar o médico e seguir certas orientações.
As complicações mais graves da doença incluem falência de órgãos.
Após certo tempo, é possível estabelecer um controle de medicação e do organismo, que faz com que a doença fique “adormecida”. Não se trata de uma cura, mas existem uma série de cuidados conhecidos e dicas (ver dicas lúpus) como uma alimentação adequada que pode auxiliar na convivência do paciente com a doença, para evitar crises e picos dos sintomas da doença.
Definição
Na verdade existem três tipos de lúpus: o lúpus eritematoso, o lúpus disseminado e o lúpus tuberculoso.
Aqui nós citaremos apenas o lúpus eritematoso e o lúpus erimatoso disseminado que são doenças relacionadas. O lúpus eritematoso é a manifestação cutânea do lúpus eritematoso disseminado, que trata-se de uma doença inflamatória auto-imune que atinge vários órgãos. O lúpus tuberculoso é a localização cutânea dos tubérculos do pulmão.
Doença auto-imune é quando as células de defesa do nosso organismo, por algum defeito, começam a reconhecer partes do nosso corpo como corpos estranhos (antígenos), fazendo com que haja toda uma resposta do nosso organismo (resposta imunológica, geralmente com anticorpos) contra células dele mesmo, o que normalmente não ocorreria.
Nos Estados Unidos, os especialistas às vezes falam em lupus como um “grande imitador” (“great imitator“), porque os sintomas costumam ser confundidos com outras doenças, principalmente devido a um número grande de sintomas diferentes (ver também abaixo em Sintomas).
O termo lúpus vem da Idade Média, do latim loup (lobo), quando um médico chamado Rogerius, descreveu como mordidas de lobo o que mais tarde descobriria ser as lesões provocadas pelo lúpus.
Epidemiologia
– As mulheres são mais afetadas pelo lúpus do que os homens. Em um comunicado publicado em outubro de 2017, o Colégio Americano de Reumatologia (ACR- American College of Rheumatology) estimou que mulheres foram 9 a 10 vezes mais afetadas por lúpus do que os homens. O ACR também observou que as mulheres de cor eram 2 a 3 vezes mais afetadas do que as mulheres caucasianas.
– As pessoas com idades entre 15 e 40 fazem parte de uma faixa etária particularmente afetada.
– O lúpus pode reduzir a expectativa de vida em cerca de 25 anos, conforme observado em um estudo publicado em 11 de outubro de 2017 na revista científica Rheumatology (DOI: 10.1093/reumatologia /kex286).
– O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é a forma mais frequente de lúpus, de acordo com o ACR.
– No Brasil, 150.000 a 300.000 pacientes adultos (maioria mulheres, em 90% dos casos) apresentam lúpus eritematoso sistêmico (também denominado LES)1.
Causa
O lúpus eritematoso é uma manifestação cutânea do lúpus eritematoso disseminado.
O lúpus eritematoso é uma doença inflamatória auto-imune de causa geralmente desconhecida.
Uma variante do gene PRDM1 parece ser responsável pelo lúpus, de acordo com vários estudos, incluindo um publicado em julho de 2017 na revista científica Nature Immunology. O PRDM1 leva à síntese de uma proteína chamada Blimp-1 que desempenha um papel na regulação do sistema imunológico, incluindo células T (em inglês: T-Cells).
A exposição solar pode agravar a doença. O uso de protetor solar é obrigatório.
É possível que alguns medicamentos provoquem a doença (em 10% dos casos). Esses medicamentos incluem os antiepilépticos, os hipotensivos ou os antibióticos.
Estudos indicam que a carência de vitamina D pode estar relacionada com o surgimento da doença, assim como de outras doenças auto-imunes.
Além disso, segundo um estudo publicado em abril de 2009, as mulheres que tomam pílula contraceptiva (principalmente as mais fortes), têm uma probabilidade 50% maior de adquirir lúpus.
Ao nível celular, o lúpus é causado pela produção de anticorpos pelos linfócitos B, que atacam o próprio organismo. Isto resulta em diferentes sintomas.
– As infecções podem desencadear o lúpus.
– O estresse e a síndrome do estresse pós-traumático (em inglês: posttraumatic stress disorder) podem ser causas ou desencadeantes de lúpus. Um estudo publicado em 20 de setembro de 2017 na revista científica Arthritis & Rheumatology (DOI: 10.1002 / art. 40222) mostrou que a síndrome do estresse pós-traumático, mas também as exposições a traumas estavam fortemente associados a um aumento do risco de sofrer de lúpus. Neste estudo de 54.763 mulheres, os pesquisadores descobriram que as mulheres com provável síndrome do estresse pós-traumático eram cerca de 3 vezes mais propensas a desenvolver lúpus.
Grupos de risco
A doença pode atingir ambos os sexos, no entanto, foi observada uma incidência maior nas mulheres jovens entre 20 e 30 anos.
Nos EUA, o lúpus disseminado afeta ainda mais os afro-descendentes.
Sintomas
– Afecções articulares que se manifestam por dores (em 90% dos doentes)
– Manifestações cutâneas diversas: eritema do rosto em forma de asa de borboleta, que se apresenta através de placas vermelhas com crostas. Geralmente esse eritema dura apenas alguns dias, mas tende a voltar com freqüência.
– Variação da pigmentação (aumento ou diminuição)
– Sensibilidade a luz ultravioleta (60 a 100% dos casos): após exposição a luz solar ou luz fluorescente, geralmente ocasiona o aparecimento de manifestações cutâneas.
– Fadiga
– Dores no peito
– Dor na boca e às vezes no nariz
Existem, no entanto, sinais generalistas que aparecem quando ocorrem surtos da doença. Estes sinais mostram uma alteração do estado geral, são eles: febre, dores de cabeça, apresentar extremidades das mãos e pés frias e pálidas ou azuladas (fenômeno Raynauld), inchaço, falta de apetite e emagrecimento. Outros sintomas podem aparecer quando a doença se propagar.
É importante saber que a doença é frequentemente caracterizada por fases ativas e fases mais calmas (falamos de remissão).
Diagnóstico
Como a doença se manifesta geralmente através de erupções cutâneas características, o médico pode diagnosticar a doença através de um primeiro exame dermatológico.
Em seguida, ele dará sequência às suas pesquisas através da testes sorológicos (identificação de anticorpos) e biopsias (coletas) nos órgãos atingidos (geralmente cutâneas ou renais).
Atualmente foi desenvolvida pela Escola Americana de Reumatologia (The American College of Rheumatology) uma tabela de critérios (ARA criteria for diagnosis of SLE) para auxiliar no processo de diagnóstico do lúpus eritematoso sistêmico.
Um novo procedimento laboratorial tem se mostrado muito efetivo, o “lúpus test band”, que detecta o depósito de imunoglobulinas (anticorpos) e componentes do complemento (resposta imune) em um tecido epitelial de um paciente com LE. Este teste não deve ser avaliado sozinho, devem ser considerados os achados morfológicos, biópsia, sorologia e imunopatologia.
Complicações
A doença progride lentamente ao longo de vários anos e é relembrada devido às suas crises, surtos sucessivos, com períodos de remissão podendo variar de alguns meses a anos.
As complicações da doença ocorrem devido a danos nos órgãos internos, como os rins, pâncreas ou intestino, sistema nervoso e o sistema cardiovascular.
– Danos ao sistema renal: destruição dos glomérulos renais, alterando sua função de eliminação, chamamos também de nefrite lúpica. Esta doença pode levar ao transplante de rim. Estima-se que a nefrite lúpica pode afetar até 50% dos pacientes com LES2. A diálise é necessária em cerca de 5% a 20% dos pacientes com nefrite lúpica, segundo estudo brasileiro publicado em julho de 2021 na revista científica Sage (DOI : 10.1177/09612033211030008).
Efeito do exercício físico
De acordo com um estudo publicado em 2017, a prática regular de exercício físico pode reduzir as complicações renais graças a um efeito anti-inflamatório. Em um estudo realizado em ratos, uma equipe da Universidade Estadual de Ohio (Ohio State University) descobriu que a pratica de exercícios físicos moderados, como 45 minutos de caminhada em uma esteira por dia, ajuda a reduzir significativamente a inflamação nos rins. Enquanto 88% dos ratos que não faziam exercícios apresentavam dano renal grave, esse número era de apenas 45% em camundongos que praticavam exercícios físicos. Por outro lado, quando os cientistas expuseram os camundongos ao estresse, o número de problemas renais aumentou. Este estudo foi publicado em 26 de abril de 2017 na revista científica Frontiers in Physiology (DOI: 10.3389 / fphys.2017.00236).
– Dano pancreático, abdominal ou intestinal: dor abdominal severa, náusea e vômito.
– Dano do sistema nervoso: gera crises convulsivas, enxaquecas, paralisia e distúrbios do comportamento.
– Dano do sistema cardiovascular, podendo desencadear endocardites, hipertensão
– Depressão.
– Trombose ou embolia pulmonar.
Gravidez: Mulheres com lúpus são mais propensas a ter complicações durante a gestação e a ter um parto prematuro. Caso queiram engravidar é aconselhável o acompanhamento médico e que a doença esteja em remissão, sem a apresentação de sintomas por pelo menos 6 meses.
Tratamentos
Nos casos benignos (danos cutâneos ou articulares), o pacienteirá administrarantiinflamatórios não esteróides (AINES) para diminuir as inflamações e as dores, e antipalúdicos. Esse tratamento pode ser acompanhado de corticóides a serem administradosem curta duração.
Medicamentos
Você deve saber que em 2021, não existem medicamentos para curar a doença. Mas é possível atuar sobre os sintomas da doença.
No entanto, nos casos mais graves, o paciente será tratado com doses mais fortes de corticóides e algumas vezes, com imunossupressores.
Em seguida, será necessário completar o tratamento conforme o órgão afetado. Em caso de dano renal, serão necessárias hemodiálises (depuração do sangueatravés demáquinas, pois os rins estão muito afetados e não conseguem trabalhar da maneira necessária).
Muitas vezes são utilizados medicamentos antimaláricos, como a hidroxicloroquina (Plaquenil®), para aliviar alguns sintomas do lúpus.
Desde julho de 2013, há no Brasil um medicamento à base de anticorpos, o belimumab (vendido sob o nome referência de Benlysta, comercializado pela GSK). Trata-se de uma proteína que inibe uma citocina chamada BAFF, que desempenha um papel nos linfócitos B.
Este é um dos raros medicamentos especialmente indicados para o lúpus eritematoso sistêmico. Este medicamento é vendido em alguns países a um alto preço (cerca de US$ 30.000 para o tratamento de um ano), o que pode naturalmente limitar o seu uso, especialmente se não há cobertura pelo plano de saúde. No Brasil, de acordo com a Folha de S. Paulo de 22 de julho de 2013, o custo anual do tratamento para uma pessoa de 60 kg é de 57 mil reais.
Este tratamento é administrado por via intravenosa (de acordo com informações de 2013). O Belimumab é particularmente indicado em casos graves de lúpus. Leia a bula e consulte o seu médico ou farmacêutico.
Possível esperança com a terapia CAR-T
Alguns pacientes foram tratados com sucesso com a terapia CAR-T, uma metodologia comumente usada contra o câncer, de acordo com um estudo alemão publicado em setembro de 2022 na Nature (DOI: 10.1038/s41591-022-02017-5). A CAR T-Cell (em inglês Chimeric Antigen Receptor T-Cell) ou terapia CAR T-Cell é um método de engenharia genética que também pertence à imunoterapia. Estes são a base de linfócitos T (células T ou T-cell) nos quais um receptor de antígeno quimérico foi introduzido. Mas é importante saber que a terapia CAR-T é uma terapia cara, em 2022 nos Estados Unidos custava cerca de 400.000 dólares por paciente3. De fato, sua fabricação exige muito trabalho e deve ser personalizada para cada paciente.
Dicas
– Além disso, em caso de surtos da doença é importante evitar o sol.
– Determinados medicamentos são fotossensibilizantes e podem piorar o problema existente no paciente que sofre de lúpus, portanto, os doentes devem se informar sobre essa eventualidade quando forem se automedicar.
– Tratamentos estéticos, como aplicação de toxina botulínica (botox) para a correção de rugas de expressão, preenchedores para a correção de sulcos faciais, rugas e redimensionamento facial, lasers para depilação e rejuvenescimento, não são recomendados para pessoas com lúpus.
– É importante manter uma dieta pobre em gordura, moderada em proteínas (carne, frango e peixe), sempre preferir carnes magras, evitando comidas apimentadas, rica em frutas, vegetais e grãos.
– É importante sempre se manter ativo, pois o excesso de repouso pode enfraquecer os músculos, o que pode piorar o quadro posteriormente. Um estudo em ratos também mostrou que uma prática regular de exercício físico moderado, como andar 45 minutos por dia, poderia reduzir a inflamação e reduzir significativamente o dano nos rins (leia mais em Complicações). Os cientistas também apontam que o Tai chi parece ser uma maneira eficaz de lutar contra o lúpus, pois ajuda a lidar com o estresse durante a prática do exercício físico.
– Sempre que for se submeter a algum tratamento médico, deixe claro que é um paciente com lúpus, pois algumas medicações podem piorar seu quadro.
– Vacinas para prevenir pneumonia e gripe são recomendadas para pessoas com lúpus, apesar de apresentarem menor eficiência do que em uma pessoa sem lúpus; já vacinas que contém vírus vivos como rubéola, pólio, varicela e catapora, não são recomendadas para pessoas com lúpus.
– Mulheres com lúpus devem se submeter a um método anticoncepcional devido aos fatores mencionados na seção complicações lúpus. A escolha de pílulas anticoncepcionais deve ser discutida com o médico responsável, pois a viabilidade da escolha do tipo de pílula varia de acordo com o quadro clínico da paciente.
– É importante descansar bem, especialmente dormir o suficiente todos os dias, porque o lúpus muitas vezes causa fadiga.
– Coma mais ômega-3 e menos ômega-6. Ingerir ômega-3 na alimentação pode ajudar em alguns dos sintomas do lúpus. De fato, uma alta ingestão de ácidos graxos ômega-3 está associada a melhor qualidade de sono e diminuição dos sintomas depressivos em pacientes com lúpus, de acordo com um estudo apresentado na conferência anual do American College of Rheumatology (ACR), realizada no início de novembro de 2017 em San Diego, Califórnia. O estudo também levou em conta a quantidade de ômega-6 consumida pelos participantes.
Ácidos graxos ômega-3 têm um efeito sobre a inflamação no corpo, com o ômega-3 geralmente atuando como antiinflamatório e ômega-6 como pró-inflamatório, ou seja, promovendo a inflamação . Em geral, as dietas ocidentais são muito ricas em ácidos graxos ômega-6 e são suspeitas de contribuirem para doenças crônicas. Os ômega-3 são encontrados em peixes gordurosos que vivem em águas frias, como salmão, sardinha e truta, além de nozes.
Fontes e referências:
Mayo Clinic, Nature Immunology, Frontiers in Physiology (DOI : 10.3389/fphys.2017.00236), Arthritis & Rheumatology (DOI : 10.1002/art.40222), Rheumatology (DOI : 10.1093/rheumatology/kex286), American College of Rheumatology (ACR).
Redação:
Por Xavier Gruffat (farmacêutico)
Fotos:
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Atualização:
Este artigo foi modificado em 20.11.2022
Bibliografia e referências científicas:
- Jornal Folha de S. Paulo de 26 de agosto de 2021
- Jornal Folha de S.Paulo de 26 de agosto de 2021
- Artigo do site americano STATNews, Borrowing CAR-T tool from cancer therapy, lupus patients go into remission, datado de 15 de setembro de 2022